"Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto, hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver”.
(Dalai Lama)


sábado, 19 de abril de 2008

APRENDA A ESCUTAR


Grandes recompensas esperam quem se dispõe a ouvir com atenção.
A alma se enriquece no silêncio da escuta.
Em troca, o outro oferece seu coração.

Não há delícia maior do que perceber alguém nos escutando, com toda a atenção. É um prazer encontrar uma pessoa que acompanhe cada palavra do que estamos dizendo e é capaz de nos compreender – com todo o coração. Se é bom ser escutado, também é ótimo escutar, estar disponível para o outro, com toda a tranqüilidade. “Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma”, escreveu o poeta português Fernando Pessoa sob o pseudônimo de Alberto Caiero.
É isso – silêncio dentro da alma. Não dá para escutar ninguém se os pensamentos estão nos atropelando sem cessar, se estamos pensando no que temos de fazer daqui a pouco. É preciso estar calmo, aberto, atento ao momento presente para poder ouvir com atenção. “Escutar é uma experiência transformadora. É testemunhar a existência”, diz o psicólogo e professor paulista Miguel Perosa. Ele garante que aprendemos muito sobre nós mesmos ao ouvir os outros. “É uma forma de nos aproximarmos da nossa alma. No fundo, as necessidades e buscas humanas são muito parecidas em sua essência”, concorda Silvana Lancia Osti, também psicóloga de São Paulo.
Algumas pessoas percebem claramente a vantagem de escutar. “Quando a gente ouve alguém com atenção, dá o sinal verde para a pessoa se abrir. A relação de troca que se forma então é muito mais rica e profunda”, garante o publicitário paulista Fernando Montessanto.
A arte da “escutatória”
Escutar é mesmo um grande exercício – que poucos dominam. “Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado um curso de ‘escutatória’. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir”, escreveu o escritor e psicanalista paulista Rubem Alves no livro O Amor que Acende a Lua (ed. Papirus). “Saber escutar é esquecer um pouco de si mesmo enquanto o outro fala”, resume com sabedoria a dona de casa paulista Maria Vaz de Souza, considerada ótima ouvinte pelo marido e por seus oito filhos. E também quem aprendeu a ficar quieto esperando o que outro tem para dizer. “Quem fala demais não deixa o outro falar. E, é claro, não abre espaço para ouvir”, sentencia a experiente Maria. Ela diz, brincando, que só desenvolveu a arte de escutar porque, quando criança, jamais comeu carne de xanxã, nome popular de um pássaro preto de bico vermelho, muito comum no interior de São Paulo. Segundo a lenda caipira, quem come daquela ave torna-se um falante inveterado. E um péssimo ouvinte.
Para desenvolver esse silêncio interior, tão necessário para o florescimento dessa arte, existem vários caminhos. Alguns podem aprender a escutar ouvindo com atenção os sons da natureza: o murmúrio de um rio, o barulho da chuva... O compositor carioca Tom Jobim, por exemplo, aprendeu a ouvir com os pássaros. Ele costumava se embrenhar pelas matas brasileiras munido de gravador e flauta transversal. Queria justamente atrair a atenção dos passarinhos para depois escutá-los com calma.
Jobim acreditava que as aves emitiam o canto mais sagrado da natureza. Para ele, todas as melodias provinham daquele cantar. Escutar os pássaros, então, funcionava como um exercício de refinamento interior, além de aprimorar o ouvido. Diante deles, a ansiedade desaparecia para dar lugar ao encantamento. Finalmente, conseguia ficar silente, sem dar um pio. E depois aplicava esse aprendizado ouvindo atentamente as pessoas.
Uma pequena resposta
E ainda há aqueles que irão cultivar a calma interna por meio da meditação. Para aqueles que escolhem esse caminho, o mestre tibetano lama Gangchen Rimpoche dá um conselho: parar com nossa mania incessante de fazer perguntas. Bel César, psicóloga paulista e sua discípula, transcreve no livro Autocura – Proposta de um Lama Curador (ed. Gaia) um trecho de conversa de seu mestre com uma de suas pacientes. Depois de o bombardear com uma série de perguntas insistentes, lama Gangchen disse a ela: “Hoje você não fará mais perguntas. Amanhã, também não fará perguntas. Depois de amanhã, a mesma coisa. Se, no dia seguinte, continuar a não se questionar, é possível que encontre dentro de você uma pequena resposta. Se continuar a não perguntar, a cada dia essa resposta irá crescer, e crescer. Por isso não posso te responder agora. Nesse momento sua mente só está ocupada com perguntas. Não há espaço para respostas”.

Extraído de http://bonsfluidos.abril.com.br/edicoes/0027/bemestar/c.shtml

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